
Em março de 2025, o governo italiano criou enorme comoção social ao aprovar um novo decreto (Decreto-Lei n.º 28/03/25) que altera significativamente as regras para a obtenção da cidadania italiana por descendência (“jus sanguinis”). Esta medida restringe o reconhecimento da cidadania apenas a filhos e netos de italianos nascidos na Itália, excluindo milhões de descendentes em todo o mundo que, até então, tinham direito ao reconhecimento com base em ancestrais mais distantes.
O consenso geral é de que os processos protocolados e pedidos administrativos feitos antes da vigência do decreto não serão atingidos.
A decisão gerou uma onda de protestos, especialmente entre as comunidades de descendentes de italianos no exterior. No Brasil, uma petição online intitulada “Ripudio al D.L. Tajani 28/03/25”, criada pela ítalo-brasileira Fabíola Leardini, reuniu mais de 52 mil assinaturas em poucos dias. Os signatários consideram o decreto uma traição à herança italiana e ressaltam que milhões de descendentes mantêm viva a cultura e a identidade italiana ao redor do mundo.

A motivação na criação do decreto
Há muito já se esperava alguma iniciativa do governo italiano para barrar um pouco os pedidos de reconhecimento da cidadania italiana como por exemplo o aumento da taxa dos pedidos judiciais e consulares para 600 euros que foi determinada no início de 2025.
Como justificativa para a severidade do decreto o governo italiano explicou a criação do decreto com base em diversos fatores. Um dos principais argumentos foi a sobrecarga do sistema administrativo, que enfrenta longas filas e atrasos na análise dos pedidos de cidadania. Com o crescente número de descendentes de italianos ao redor do mundo buscando o reconhecimento, os consulados e órgãos internos italianos têm enfrentado dificuldades para processar as solicitações de forma ágil.
Outro fator apontado pelo governo foi a preocupação com a autenticidade dos pedidos. Nos últimos anos, diversas investigações revelaram casos de fraudes e concessões irregulares de cidadania. Dessa forma, a introdução de exigências como a prova de vínculo cultural e auditorias em processos já concluídos busca garantir que apenas aqueles com verdadeira ligação à cultura italiana obtenham a cidadania.
Além disso, há uma preocupação econômica por parte da Itália. Muitos novos cidadãos reconhecidos não residem no país e não contribuem para a economia local, o que levou o governo a adotar medidas como a exigência de residência mínima na Itália para validar a cidadania. Essa mudança busca incentivar a integração efetiva dos novos cidadãos à sociedade italiana.

Argumentos sobre a inconstitucionalidade do decreto
Diversos juristas e entidades defensoras dos direitos civis apontam que o decreto pode ser inconstitucional por violar princípios fundamentais da Constituição Italiana além de Tratados Internacionais. Entre os principais argumentos estão:
- Violação do princípio da igualdade: O decreto cria uma distinção entre descendentes de italianos com base em critérios arbitrários, como o grau de parentesco e a exigência de residência, o que pode ser considerado discriminatório, os descendentes de italianos não estão requerendo um benefício, querem somente o reconhecimento de uma nacionalidade de origem.
- Retroatividade prejudicial: A revisão de processos anteriores e a possibilidade de revogação da cidadania concedida anteriormente violam o princípio da segurança jurídica, essencial para garantir estabilidade aos cidadãos.
- Restrição indevida ao “jus sanguinis”: A Constituição Italiana reconhece a cidadania por descendência como um direito fundamental, e a imposição de novas barreiras pode ser interpretada como uma violação desse direito.
- Imposição desproporcional de exigências: A necessidade de comprovação de vínculo cultural e a residência obrigatória na Itália podem ser vistas como restrições excessivas e incompatíveis com os princípios constitucionais de liberdade e acesso à cidadania.
Caso todos os recursos internos sejam esgotados, a medida poderá ser questionada em cortes internacionais. Especialistas indicam que a norma pode ser levada à Corte Europeia de Direitos Humanos e a organismos da ONU, visto que a Itália é signatária de tratados que asseguram direitos de nacionalidade e vedam discriminações baseadas em origem ou território. “A Corte Europeia já se posicionou contra legislações similares no passado, ao considerar que restringiam o acesso à nacionalidade sem fundamento jurídico adequado”, destaca Fermanian.

Processo de conversão do decreto em lei e possibilidade de alteração
O decreto-lei entrou em vigor imediatamente após sua publicação, mas precisa ser aprovado pelo Parlamento italiano dentro de 60 dias para se tornar uma lei definitiva. Durante esse período, os parlamentares podem propor emendas para modificar, suavizar ou até mesmo revogar as novas regras. Caso o decreto não seja convertido em lei dentro do prazo, ele perde automaticamente sua validade e os direitos de cidadania voltam às regras anteriores.
Dado o impacto significativo das restrições, diversos grupos de descendentes de italianos, políticos e entidades de direitos civis estão pressionando o Parlamento para modificar os pontos mais rígidos do decreto. Entre as possíveis alterações estão a flexibilização do limite geracional e a redução da taxa de processamento.
A pressão internacional sobre o governo italiano deve persistir nos próximos meses, enquanto descendentes e organizações buscam reverter ou amenizar os impactos das novas restrições. Os próximos debates parlamentares serão decisivos para definir o futuro das novas regras de cidadania italiana.
O momento agora pede paciência para aqueles que pretendem entrar com o pedido de reconhecimento da cidadania italiana, pois a situação pode mudar no decorrer desses sessenta dias e até mesmo depois, podendo ser estabelecidas regras menos severas ou até mesmo ser o decreto totalmente anulado.